TELEBRASIL 2006: as telecomunicações e a saúde

Um dos desdobramentos do tema “As telecomunicações para a Inclusão Social” do 50o Painel TELEBRASIL, no Club Med, foi o da saúde. Ela é um dos quatro grandes subtemas da aplicação das telecomunicações pelo Estado, em benefício da qualidade de vida da população (os outros são educação, segurança e previdência).

A grande seção referente às TeleComunicações para a saúde foi moderada pela jornalista Camila Guimarães, da Revista Exame. Pedro Garcia Aspillaga, ex-ministro da Saúde do Chile, traçou um panorama da revolução ocorrida em seu país na área da saúde. Seguiram-se os debatedores Cláudia Giuliano Alves da Costa (Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo), Magdala de Araújo Novaes (núcleo de Telesaúde NUTES da UFPe), Luiz Ary Messina (projeto RUTE da RNP), Angélica Baptista da Silva (Fiocruz), Fábio Gandour (IBM Brasil) e Pedro Ripper (Cisco Brasil).

Chile

Pedro Garcia Aspillaga, que se expressou em espanhol, explicou que a mudança ocorrida no Chile na área da saúde, de 1960 a 1980, teve caráter cultural. Foi baseada na eqüidade – ricos e pobres têm os mesmos direitos de acesso à saúde – com funcionamento em rede, parceria público-privada e ênfase em medidas de prevenção.

– Saúde não é só hospital. Saúde começa pela maneira como se vive e como se come. Saúde é motor do desenvolvimento para qualquer país. É importante manter a população fora dos hospitais – observou o ex-ministro.

O Chile, com 5 mil km de extensão e por 150 a 200 km de largura, tem uma geografia particular. Hoje, estão ligados por Internet, 28 serviços de saúde autônomos, que empregam 100 mil pessoas; têm 200 hospitais e 500 postos de atendimento. A quase totalidade da população (90%) possui um número de identificação que utiliza nas transações. Das 3,3 milhões de famílias, 940 mil (29%) têm acesso à Internet.

– É importante que a população colabore ativamente para haver melhoria no atendimento – disse o palestrante. Ponto importante foi a Lei de Reforma do sistema de saúde, dividido em saúde pública (políticas públicas) e de redes de hospitais e centros de atendimento. O sistema de saúde chileno se vale do sistema Auge, uma ferramenta implantada em 2002 que dá prioridade de atendimento para as pessoas em situação mais grave, em um rol de enfermidades e que pagam segundo as suas posses.

No Chile, foi elaborado um plano diretor de telecomunicações e de informática para a área da saúde. A estratégia foi somar o trabalho do setor público com o da iniciativa privada. São 60 sistemas de videoconferências e 1.900 equipes médicas. Na prevenção do enfarte, um clínico pode enviar o eletrocardiograma do paciente, via Internet, para uma central que dirá a melhor conduta a adotar. O sistema de saúde tem um call center com atendimento de 24H/7D.

O palestrante emocionou a platéia, ao mostrar um vídeo em que parentes pobres em zona distante, via videoconferência, confortam um filho que foi enviado a um hospital mais central. Durante o debate, aberto à platéia, observou o ex-ministro que num cenário de introdução de novas ferramentas de informática, rumo à Sociedade da Informação, há interesses perdedores e ganhadores como em toda mudança.

– A condição de sucesso para a área da saúde é a vontade política, traduzida por uma estratégia continuada. Esse não é um tema que pode ser delegado pelas autoridades. Requer um esforço sustentado, voltado para solucionar um problema que deve ser encarado como prioritário – finalizou o médico e ex-ministro Pedro Garcia Aspillaga, em meio a aplausos. O palestrante compareceu ao Painel a convite da Cisco do Brasil.

São Paulo e Pernambuco

Cláudio Alves da Costa, médico formado pela Unicamp, hoje está na Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo, um setor responsável por uma rede de 15 hospitais com 30 mil leitos, 388 unidades de saúde, 65 unidades de saúde mental e 50 mil profissionais de saúde ligados ao órgão. São 20 milhões de consultas/ano, 15 milhões de procedimentos e 8 milhões de atendimentos de urgência.

O debatedor tratou do Projeto SIGA, um sistema de informações utilizado na área da saúde na cidade de São Paulo e que já ganhou até reconhecimento internacional. Através do SIGA, suportado por base de dados Oracle e arquitetura Java, consultas são agendadas ao ritmo de uma a cada quatro segundos. “A saúde se resolve com o binômio tecnologia e pessoas bem preparadas”, disse Cláudio Alves da Costa.

Dentre os atuais desafios para o projeto SIGA, destacam-se o upgrade.das conexões e dos acessos para operar em mais alta velocidade e a circulação de imagens médicas pela rede. 

A debatedora Magdala Novais, da área de TICs (tecnologia da informação e comunicação) para a Saúde de Pernambuco – geograficamente um Chile na horizontal –, descreveu que no Brasil são 8 mil hospitais, 25 mil laboratórios, 17 mil clínicas, para 184 milhões de pessoas em 5.561 municípios. Destes, 73% possuem menos de 20 mil habitantes. Os gastos com saúde ocorrem 40% no setor público e o restante no setor prIvado. O SUS atende a 80% da população em 5,8 mil unidades hospitalares.

O modelo ideal para o SUS (sistema unificado da saúde) seria assistir 5% da população em hospitais, 15% em policlínicas e o restante na medicina básica. Na prática, porém, o setor básico resolve apenas 30 a 40% das ocorrências, sobrecarregando o topo da pirâmide. Dentre as dificuldades que a vida real oferece, situa-se a fixação do profissional médico em municípios mais carentes. Em Pernambuco, a Rede de Núcleos de Telesaúde (NUTES), com base em TICs se destina a permitir a videoconferência, o acesso à Internet e o ambulatório virtual, explicou Magdala Novais.


A voz do povo é a voz de Deus. O componente humano é fundamental no sistema de atendimento à saúde. Distorções econômicas, hoje, desmotivam os profissionais do SUS. Mas se fala em salários de até R$ 10 a 15 mil para profissionais que migram para áreas interioranas. “O Telesaúde é um elemento que se revela fundamental no processo da saúde da população”, enfatizou a debatedora. O Governo de Pernambuco lança a rede PE-Multidigital, com um backbone digital cortando o estado, de Recife a Petrolina e até a Arapirina. São cerca de 2.800 pontos mutidigitais, 20 mil pontos de voz e 50 espaços para cidadania. O processo e o edital foram concluídos ao final de 2005.

Telemedicina universitária

– Que a saúde chegue mais barato e mais depressa – foi a citação trazida ao debate por Luiz Ary Messina. No Ministério da Saúde, cada R$ 1,00 investido retorna R$ 30,00 para o País. O debatedor tratou da RUTE – Rede Universitária de Telemedicina do Ministério da Ciência e Tecnologia –, como parte da RNP – Rede Nacional de Ensino e Pesquisa – e apoiada pela Abrahue – Associação Brasileira de Hospitais Universitários de Ensino.

A telemedicina nasce no mundo nos anos 60 e tomou impulso no Brasil na década de 90. A Rede Ipê é o nome de um backbone nacional que é utilizado pelos Ministérios da Saúde, da Educação, da C&T e da Defesa. Está presente em 26 estados e no Distrito Federal. A idéia é fazer o upgrade de toda essa rede para 2,5 Gbit/s. Hoje, apenas 10 estados estão ligados em velocidades entre 2,5 e 10 Mbit/s.

O tema telesaúde, aos poucos, toma vulto. O Ministério da Saúde tem projeto para nove pólos e 900 sites. Na formação de pessoal, surge a disciplina de Informática na Saúde, nas faculdades de Medicina. A Portaria 561 (16/03/1006) instituiu a Comissão Permanente de Telesaúde. O projeto RUTE teve R$ 5 milhões liberados para interconectar faculdades, hospitais universitários e centros de ensino na saúde. Estão previstos videoconferência, telediagnóstico e educação à distância.

A debatedora Angélica Silva, da Fiocruz, discorreu sobre as realizações do programa RADIS – Reunião, Análise e Difusão de Informações da Saúde –, criado em 1982, na Escola Nacional de Saúde Pública, da Fundação Oswaldo Cruz. A concepção é que a saúde pública depende muito da comunicação, da divulgação e da integração dos diversos agentes e do público para ter sucesso. A revista RADIS com mais de 100 títulos tem distribuição de 270 mil exemplares/ano. A Biblioteca da Fiocruz conta com 63 mil volumes.

Já o Canal Saúde, desde 1994, leva informações  sobre saúde, via canais de televisão, para 3,5 mil localidades do território nacional. Ele utiliza recursos audiovisuais e meios complementares em verdadeiros programas de divulgação e de aprendizado à distância. São cerca de 40 horas de programação por semana, através de 11 emissoras para todo o Brasil.

O Projeto CSIA – Canal Saúde por Internet na Amazônia – utiliza-se de 1 mil pontos, via satélite, para levar informações na Região Amazônica. O PDICS – Projeto de Inclusão Digital dos Conselhos e Secretarias Municipais de Saúde – visa combater o gap de conectividade existente entre os órgãos de saúde. Tradicional pólo de integração, as Conferências Nacionais da Saúde se reúnem de quatro em quatro anos e congregam milhares de delegados. A 13a edição da CNS vai ocorrer em 2007, com participação prevista de 5 mil pessoas de todo o País.

IBM e Cisco

O executivo da IBM Brasil Fábio Gandour mostrou, de forma bem humorada, como laboratórios, ciência e mercado são realidades interconectadas. Citou previsões do Gartner Group. Para 2010, nos EUA, 30% das residências estarão conectadas apenas por celular. Para 2013, um aumento de 50% no uso de software aplicativo para a saúde ajudará a salvar 20 milhões de vidas adicionais.

Fábio Gandour, ele próprio médico, alfinetou a classe ao dizer que a saúde é tema importante demais para ser conduzida apenas por médicos. Com isso, quis lembrar que a tecnologia da comunicação, somada à da computação, hoje são partes integrantes dos serviços de saúde, tal como no passado, arroz, feijão, água e sabão foram preconizados como medidas básicas pelo sanitarista brasileiro Oswaldo Cruz.

Hoje, a economia da ciência médica mudou de patamar econômico. Uma nova molécula medicamentosa pode custar US$ 400 milhões e sete a oito anos para chegar ao mercado. Supercomputadores capazes de manejar um petaflop (10 15  operações por segundo) são usados nas pesquisas da genômica e da farmogenética. Hoje, é possível ter um modelo virtual do corpo humano, visível numa tela. Sensores e atuadores ajudam o mundo da saúde, que é movido a eventos e sintomas. ”A indústria das TICs são alavancadoras da saúde”, finalizou  debatedor, para quem no Brasil falta uma identidade maior na a área da saúde pública.

Pedro Ripper, executivo do setor de telecomunicações da Cisco System, defendeu com brio o conceito de saúde conectada. A comunidade da saúde é extensa e os resultados são melhores quando os agentes respectivos estão conectados em rede. Diversos portfolios tecnológicos podem ser ativados visando à área da inclusão social. Dentre eles, cartões de identificação eletrônicos para agilizar consultas, utilização de TICs para tratar as instituições de saúde com eficácia empresarial e soluções para treinamento e educação de pessoal à distância.

Outro papel importante das TICs é servir de fonte de informação frente a um mundo ameaçado por epidemias. Em 1918, estimou-se que morreram 50 milhões de pessoas vítimas da influenza. A dados de 2006, a Aids já matou 23 milhões de doentes e 200 milhões de indivíduos estariam infectados pelo vírus HIV. As chamadas zoonoses, como a gripe aviária e a doença da vaca louca, estão rondando a população mundial, hoje, estimada em 6,5 bilhões de pessoas.

Análises demonstram que vírus letais, identificados por siglas alfanuméricas como H5N1, H9N2 e nível BSL4, se estiverem operando num cenário de contatos interpessoais de 50%, poderão eliminar até 1,5 bilhão de pessoas (uma em cada quatro). Com apenas 7% de contatos, a mortalidade cai para 200 milhões de indivíduos. A mobilidade em tais cenários se reveste, então, de importância fundamental. “As pessoas serão instadas a permanecer e trabalhar em casa. Em tal cenário, o papel das telecomunicações e das TICs passa a ser essencial”, projetou Pedro Ripper. 

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