51° Painel TELEBRASIL: Brasil Digital surge como realidade irreversível – Debate IV

Neste módulo, continuamos com o registro do debate, ocorrido entre os palestrantes com a participação da platéia, durante o 51º Painel TELEBRASIL, encerrando as atividades do segundo dia. Coordenou o debate o jornalista Ethevaldo Siqueira que contou com os presidentes das operadoras, representantes da Casa Civil e da Câmara dos Deputados. O evento, ocorrido na Costa do Sauípe (BA), de 31/05/2007 a 02/06/2007, reuniu cerca de 400 participantes, dentre autoridades, políticos, reguladores, decisores, executivos, especialistas, formadores e multiplicadores de opinião que discutiram o tema Brasil Digital.

Debate IV – encerrando as atividades do segundo dia

Temas: remuneração do serviço por transação – Estado como mau prestador de serviços – universalização do celular com 2G e 3G – banda larga – funding – política pública – informática como serviço – declínio da telefonia fixa – compartilhamento de infra-estrutura – TV digital e interatividade – competição analisada –moedas para a universalização – FUST – marco regulatório

Continuando com o registro dos debates do segundo dia do Painel, iniciado no módulo Debate III, o módulo IV prossegue com o debatedor inscrito da platéia, empresário Carlos Rocha, da Samurai. Um freqüentador assíduo dos Painéis TELEBRASIL e um debatedor entusiasta, a convocação de Carlos Rocha pelo moderador do debate, jornalista Ethevaldo Siqueira, sob o conselho preventivo “procurem ser breves”, trouxe o riso incontido e simpático de uma platéia amplamente participativa e acostumada com as “perguntas-minipalestras” do convocado.

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Carlos Rocha iniciou seu estimulante pronunciamento destacando a importância do posicionamento das concessionárias – como indicado nas palestras do 51º Painel – por serem elas prestadoras de serviços públicos:

– As concessionárias são dotadas de um dimensão que permite ampliar os serviços públicos, dando ao País o que ele necessita e que por isso mesmo elas são reguladas. Seria interessante até, por analogia, que o sistema bancário fosse também regulado e que seus lucros revertessem na universalização dos serviços, e os bancos não investissem apenas onde o lucro é maximizado.

O palestrante Carlos Rocha observou que “universalizar não é apenas prover banda larga. O consumidor não sabe o que é banda larga, algo que, em si, não serve para nada. O que o consumidor almeja é ter uma plataforma transacional para serviços digitais. A importância das concessionárias reside em prover a interface necessária com o consumidor. Não existiriam 100 milhões de celulares, se o dispositivo de acesso – o aparelho celular – não estivesse de posse do consumidor”.

Encadeando seu pensamento, o empresário da Samurai acrescentou que “o modelo do computador pessoal (PC) não nos atende, como sociedade. A obsolescência do ativo (isto é, do computador) está fora do modelo de decisão do País. Seria importante que as concessionárias assumissem a interface com o cidadão para a Web 2.0 (a Internet de nova geração) e que trouxessem para o consumidor a interatividade para a TV digital. É uma posição que as concessionárias poderiam ocupar de forma remunerada, tarifando por transação e acabando com o flat fee cobrado pelo uso de banda larga e que inviabiliza qualquer modelo de negócios. Quando o modelo tiver a remuneração sendo cobrada por transação, o Estado vai poder cobrar por serviço efetivamente prestado e a plataforma poderá ser compartilhada. Apenas as concessionárias são os agentes com dimensão e competência estrutural para criar tal modelo”.

Chegando ao ponto central de sua intervenção, Carlos Rocha lançou com insistência um repto para que as concessionárias “assumissem o compromisso de iniciar uma discussão para criar um padrão de oferta de serviços digitais que seja seguro, identificando a transação e que permita aos agentes privados e de Governo pagar pela transação, tal como hoje sucede no sistema de telefonia”.

Finalizando o que acabou se configurando como uma minipalestra, o empresário afirmou que “não adianta doar um computador para uma escola ou botar banda larga num estabelecimento de ensino, se não houver meios de viabilizar o serviço. O Estado demonstrou, ao longo dos anos, não ser um eficaz prestador de serviços, tal como é a empresa privada que responde pela qualidade do serviço perante uma agência reguladora. O Estado presta um mau serviço.

Desconsiderando o cidadão, deixa uma pessoa 12 horas na fila do INSS e não tem ninguém que cobre”, disse o debatedor, esquecendo a ação da imprensa e da opinião pública.

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Orientadas pelo moderador Ethevaldo Siqueira, as concessionárias presentes responderam ao desafio da universalização da banda larga colocado por Carlos Rocha. O presidente da Telefônica, Antonio Carlos Valente, premido pelo tempo, disse que o desafio posto pelo debatedor para as concessionárias estava aceito, mas que se tratava de “um assunto pesado, envolvendo coisas tais como neutralidade de rede e tarifação”. O presidente da Oi/Telemar, Luis Eduardo Falco, acrescentou que o desafio também estava aceito, porém havendo uma certa confusão: “as concessionárias têm um contrato para universalização de voz, algo que fizeram bem. Já a universalização da banda larga é outra coisa, que requer funding, política e contratos. A universalização de dados e de serviços é mais complicada do que a da voz”.

O presidente da CTBC, José Mauro, indicou que sua operadora serve há um milhão de clientes, entre fixos e celulares, com 160 mil em banda larga. “Não satisfaz mais a CTBC, como operadora, dar apenas o acesso em banda larga. Buscamos na informática não apenas um suporte à operação, mas também sua integração na oferta de serviços. Vem muita coisa por aí nessa área à qual, no Brasil, não se está suficientemente atento. É um novo negócio que surge em telecomunicações”. O presidente da Brasil Telecom, Ricardo Knoepfelmacher, observou que sua operadora tem 16% das linhas em serviço em banda larga. Como o negócio da telefonia fixa de voz está declinante, banda larga e telefonia celular passam a ser muito importantes. Lembrou o executivo que “o movimento mundial na cobrança ainda é flat rate”.

O próximo debatedor foi o presidente da Claro, João Cox, que comentou o tema da evolução do celular. O movimento é na direção do 3G (terceira geração) de banda larga, com a tecnologia WCDMA (wideband code division multiple access) chegando. Isto vai criar a possibilidade de um maior compartilhamento. Observou o executivo que “o compartilhamento de infra-estrutura no celular já ocorre com o co-sharing de torres no qual players compartilham a mesma torre. Agora é o momento de avaliar os próximos desenvolvimentos”.

No entender do executivo da Claro, trata-se de “uma decisão empresarial entre agentes privados que o Estado não deve regular. Na universalização da banda larga celular de terceira geração, a freqüência prioritária escolhida pelo País de 2.1 GHz exige, por razões técnicas, maior número de antenas do que se fosse efetuada em freqüência mais baixa. A nova geração 3G também se destaca por prover maior velocidade de dados do que a geração anterior”.

Segundo o debatedor, numa discussão sobre a universalização da banda larga será preciso discutir se não se deve universalizar, primeiramente as pontas do sistema celular com tecnologia 2G para depois passar a 3G. “A remuneração do investimento passa pela remuneração do serviço prestado e pelo lucro operacional. A equação tributária e fiscal que o País apresenta torna complexa a universalização da banda larga”, previu o presidente da Claro.

O debatedor André Barbosa, da Casa Civil, foi o próximo a falar, lembrando que no caso da televisão digital, a ênfase hoje dada é na transmissão que vem pelo ar, nos chips e nas redes de broadcasting e que está ficando esquecido o outro lado da moeda, a interatividade. “É a questão de poder trabalhar serviços públicos através da televisão digital. Se for necessário, isto será trabalhado através da TV Pública”, prometeu o representante da Casa Civil. Vamos lançar a questão da interatividade com prestação de serviços da Caixa Econômica, do Banco do Brasil e de estatais, caso o mercado de broadcasting ou de telefonia fiquem acanhados.

Disse André Barbosa que será importante dirigir investimentos para a feitura de “caixinhas” e, sobretudo, de modelos audiovisuais que permitam praticar a interatividade local e depois, a plena. Na interatividade plena – ainda inexistente no mundo –, o receptor (isto é, o espectador) se confundirá com o produtor de conteúdo e poderá construir e desconstruir imagens e sons.

Já a interatividade local será aquela em que se pode importar um trabalho do INSS – que chegará pelo ar a 95% das pessoas utilizando a rede de broadcasting – e haver um programa (um software) que permitiria acessar localmente informações do INSS, do Fundo de Garantia, do PIS/PASEP ou do Sistema Nacional de Habitação.

Explicou o debatedor que será “essa interatividade restrita que, em muitas localidades, permitirá que a televisão digital aberta leve a informação ao cidadão sem recursos, que precisa tomar dois ou três ônibus para chegar a um posto e se informar. São questões fundamentais, de caráter público, para as quais eu vim pedir a contribuição desse setor fortíssimo, sob forma da aplicação de recursos não só na questão do software multiplataformas, mas também nas questões da integração do middleware brasileiro e do set top box”.

O último debatedor inscrito foi o deputado Jorge Bittar (PT-RJ), que falou, com a verve e prolixidade do experimentado político, sobre vários temas de importância para o setor. O primeiro tema foi o da competição que, “sempre que abordado, gera um clima pesado”.

Explicou o parlamentar que “a competição foi um dos itens da privatização – com a idéia das espelhos e espelhinhos com tecnologia WLL (wireless local loop) que ocupariam fatias significativas do mercado – que não deu certo, visto que a tecnologia WLL nem pela qualidade de serviço e nem pelos preços praticados conseguiu competir. A verdade dos fatos é que as empresas incubents passaram a ser dominantes no mercado local”.

Admitiu o debatedor que “hoje, pela primeira vez, estão sendo dadas as condições reais para que surja a competição para valer no mercado local. Os serviços de voz, aqui e no mundo, são declinantes por várias razões. Uma delas é que se a pessoa tem acesso a um serviço de voz móvel, ela julga desnecessário ter o serviço fixo em casa. A outra, é que a pessoa pode querer outros produtos, além do serviço de voz, como o acesso à Internet e coisas desse tipo”.

– O advento de novas tecnologias em banda larga – como celular 3G e o WiMax – com qualidade e preço vai estimular a competição. Para chegar a um mercado equilibrado do ponto de vista da competição, será preciso estar vigilante quanto ao marco regulatório e à atuação da Anatel e do CADE, um papel que cabe a todos nós – advertiu o parlamentar.

Quanto ao problema da universalização da banda larga, há a questão do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações, sobre o qual o debatedor fez algumas considerações: “o fato é que, pela primeira vez, se estão criando as condições reais para haver a universalização. Relativizando, disse o parlamentar que achava “interessante que a liberação do Fust para a universalização só agora ocorra, porque os custos serão bem menores, em relação aos que tivessem sido feitos anteriormente”.

Em relação ao tema político do marco legal, observou o parlamentar que há um projeto de lei do senador Aloisio Mercadante (PT-SP), que já transitou no Senado Federal e está em vias de ser enviado à Câmara dos Deputados, que vai mudar a legislação do Fust, permitindo a sua livre utilização. Todos os prestadores de serviços do setor de telecomunicações poderão participar das licitações e os recursos não serão mais aplicados necessariamente na universalização dos serviços de voz.

Disse ainda um otimista José Bittar que, “hoje, há uma coordenação firme e estabelecida do Governo, com Cesar Alvarez, Oswaldo Oliva Neto, a equipe de suporte do CPqD e os ministérios que fazem aplicações em educação, saúde e até comunicações. Do ponto de vista político, o setor de telecomunicações está no caminho correto. Existem os quadros gerenciais.

O último tema tratado pelo parlamentar foi o dos recursos financeiros, em que há o problema do funding e de várias moedas que podem ser utilizadas com imaginação.

Uma dessas moedas é a da “troca dos PSTs (postos de serviços de telecom) por obrigações de universalização da banda larga. Afinal, trata-se de dinheiro público – uma norma contratual – para o qual o Estado brasileiro agora, através de seu Governo, julga ser mais útil para a sociedade a sua utilização na universalização de banda larga do que sua aplicação em PSTs isolados. Outra moeda seria a da utilização do Fust”.

– Outra quase moeda é a da licitação da terceira geração do celular (3G). A licitação para a venda de outorgas. O dinheiro seria arrecadado para o Tesouro e depois seria liberado através do Foste. As empresas que queiram outorgas para 3G poderão adquirir as licenças desde que se comprometam em ampliar, em grande parte, a sua cobertura em 2G e 3G. Isto significa levar o backhaul de alta velocidade à áreas do País, hoje, não atendida por esses serviços. O ideal é ter essa comunicação de banda larga em alta velocidade disponível para que outros players possam disputar localmente o mercado em banda larga com outras tecnologias.

Continuando, disse que “outro dinheiro é o que está no orçamento da União para o Projeto GESAC (Governo Eletrônico – Serviço de Atendimento ao Cidadão) do Governo Federal, que pode ser considerado dinheiro do Fundo. Poderia haver uma cesta de recursos que garantam um projeto sério e sustentável para um problema inadiável que é a implantação da banda larga em nosso País.

Encerrando o debate, o moderador jornalista Ethevaldo Siqueira observou com propriedade que o único assunto que não havia sido tocado no Painel, quanto ao tema de redes, era o papel desempenhado pela Internet. Sugeriu que na esteira do Brasil Digital, a TELEBRASIL promovesse um debate sobre um Brasil IP, onde se poderia “discutir e aprofundar o papel desempenhado pela Internet, uma rede que é muito pouco submetida a controles e regulamentação”.

O clima de alto nível que permeou todos os debates do 51º Painel terminou com chave de ouro, representada pelas palavras elegantes e políticas do jornalista Ethevaldo Siqueira, ao precisar para a assembléia que “pedia desculpas pela candência ocorrida no debate do dia anterior, no qual não quis ofender nem o senador (Wellington Salgado – presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática do Senado Federal) presente ao Painel e nem o ministro das Comunicações, Hélio Costa (PMDB-MG), que anunciou uma medida positiva sobre a realização, em agosto, de um seminário no Senado Federal, também com a Câmara, para recolher o máximo de sugestões e idéias numa extraordinária audiência pública para uma nova legislação de comunicações no País”.

Acrescentou Ethevaldo Siqueira ter elogiado, como colunista (O Estado de São Paulo) e radialista (Rádio CBN), essa iniciativa do ministro como um fato extremamente positivo, não sendo, portanto, “um inimigo sistemático e fechado, nem do atual Governo e muito menos do ministro Hélio Costa. Todos nós merecemos todo o respeito, até que, por alguma razão, se o perca”. A plateia aplaudiu.

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