51° Painel TELEBRASIL: Brasil Digital surge como realidade irreversível – Referência Conceitual III

Neste módulo, o eclético pronunciamento do empresário Carlos Rocha, da Samurai, com o título “Soluções de TICs (Tecnologia da Informação e da Comunicação) para o Brasil Digital – Um Quadro de Referência Conceitual”, abrindo o ciclo de palestras e debates do segundo dia do evento da TELEBRASIL, ocorrido na Costa do Sauípe (BA), de 31/05/2007 a 02/06/2007. O 51° Painel, focado no tema geral “Brasil Digital”, se insere na estratégia maior da TELEBRASIL – Associação Brasileira de Telecomunicações. A empresas Samurai, Siemens e Brasil Telecom, citadas no texto, são Associadas TELEBRASIL.

Carlos Rocha (presidente da Samurai)
A oportunidade não pode ser desperdiçada.

Empresário, engenheiro eletrônico, ex-presidente da Abicomp e da Automática (anos 80 e 90), sócio-fundador da Fundação Casimiro Montenegro Filho (de ex-alunos do ITA) e do IEI – Instituto Escola Integrada –, Carlos Rocha foi, dentre outra atividades, quem coordenou o programa da urna eletrônica brasileira.

A provocadora palestra de Carlos Rocha, introduzindo o Quadro de Referência do Brasil Digital, contou com a sinergia emocional de slides de alto impacto. Eles iam sendo exibidos em telões para a platéia, à medida que prosseguia o discurso do empresário, cheio de idéias, impaciência e sugestões, como, por exemplo, três silhuetas de meninos de rua, na contraluz, com a interrogação “o futuro?” ou uma maleta preta cuspindo dinheiro pelas beiradas com a rubrica “Corrupção”.

Iniciou o palestrante dizendo que “existe um universo de receita no mercado à disposição do setor das TICS (Tecnologia da Informação e da Comunicação). O bancos têm resultados e lucros bastante grandes e uma alta competência política – inclusive com um órgão no Governo, o Banco Central –, o que lhes garantiu resultados fabulosos nas últimas décadas. Há outras organizações, algumas associadas às telecomunicações, que vendem computadores e software e que permitem transformar valor agregado em lucro”.

– O setor de telecomunicações possui uma deficiência genética. Ao se perguntar qual é o nosso negócio, é muito comum que um colega engenheiro responda: é faixa passante, é tráfego! Geralmente, fico constrangido e ouso perguntar se também dá para ganhar dinheiro –, disse Carlos Rocha, ponderando que “os principais executivos do setor têm, obviamente, este objetivo, mas a idéia de valor agregado ainda é pouco disseminada no setor”.

– O samurai tem um compromisso com o equilíbrio, com o caminho, o que nos leva a perseguir valores e princípios. O que hoje preocupa é a percepção da ausência de princípios por detrás das ações.

Os telões mostravam a representação de Miyamoto Musashi (1584-1645), samurai japonês do século XVI, apoiado numa ka-ta-na (espada) e autor do “Livro dos cinco anéis” (o mais importante tratado da formação do guerreiro samurai), “que fez a transição entre o guerreiro tradicional e o lutador intelectual”.

“Existe dinheiro na base da pirâmide”. Outro slide mostrava uma pilha de dólares. “Quando se vê a preocupação das operadoras em atender os 10% ou até mesmo os 5% da sociedade, é bom lembrar que os estudiosos dizem que há muito dinheiro a ser ganho na base da pirâmide. Mas é preciso que isto seja fruto de uma ação integrada”.

O slide seguinte exibiu logotipos de empresas, com o comentário do empresário: “não consegui colocar todos os logotipos do setor, mas considerem-se representados”. Incluiu também outros que não são sócios tradicionais do setor de telecomunicações, como Google e Intel, “que representam parceiros na transição que vivemos”.

Ir além do serviço de voz

“Somos um excelente arrecadador; existe uma montanha de dinheiro no usuário”. Um slide trouxe uma moeda de R$ 1 com um entalhe de 40% do fisco.

Carlos Rocha vende sua tese: “nesse dinheiro arrecadado, também está a nossa oportunidade. Queremos incentivos de ICMS, não para reduzir a receita do Estado, e sim para que parte desse dinheiro nos permita exercer o papel do Estado em outros segmentos, nos quais, hoje, não atuamos. O setor é um prestador de serviços de utilidade pública e pode aumentar seu papel. Não é possível que o setor continue a ser de utilidade pública apenas no serviço de voz. A nova plataforma digital precisa ser transformada num universo de serviços. As oportunidades são inúmeras.”

Segue-se outro slide, onde a tela do computador de mesa tem um papel colado com Não Funciona e o comentário: “o Governo é muito eficaz na arrecadação de recursos, na Receita Federal, no Banco Central, mas é um péssimo prestador de serviços. Tal situação perdura há décadas e não vai mudar. O consumidor é tratado pelo Estado com o maior descaso, com o mais absoluto desrespeito. Fica horas na rua, na chuva, para pegar uma senha para ser atendido. Enquanto isso, o setor de telecomunicações faz ofertas para serviços transacionais para milhões de indivíduos com autenticação, com uma plataforma de serviços que poderia viabilizar a oferta de outros serviços”.

“Não adianta comprar e distribuir equipamentos num mundo tecnológico complexo por que isto não funciona. O Estado precisa que o setor de telecomunicações se integre para oferecer soluções completas. É preciso oferecer transações de serviços, end-to-end, como hoje oferecemos transações de voz. Transações bilhetadas com garantida de serviço”.

Invocando a mitologia de Star Wars, que, supõe-se, todo mundo na platéia conheça, diz o palestrante: “este é o lado negro da força”. É a vez do slide da maleta preta com dinheiro, seguido de ácido comentário: “este é o lado que nos prejudica. Não quero, com isso, que cada um vá buscar, em seu âmago, a sua ação cidadã para ficar indignado. Apenas digo que a corrupção é mau negócio. Ela atrapalha o lucro. Para atender os acionistas que querem melhorar o valor da empresa, temos que oferecer soluções que inviabilizem intrinsecamente a corrupção. Tais soluções têm que garantir autenticação e rastreabilidade, inviabilizando transações anônimas. Já temos o banco de dados”.

Surge nos telões um slide de diagramas de barras. “Infelizmente o Brasil tem crescido no índice de percepção da corrupção. Começou, em 2002, com 45 e agora já atinge 70. Podemos continuar para 75, 80 ou, então, como líderes e empreendedores, oferecer plataformas de serviços do Brasil Digital para que a tendência possa se reverter. Nos dados de e-readyness, da Unidade de Inteligência da Revista The Economist, com apoio da IBM, o Brasil perde posições relativas, o que significa menos lucro”.

Agora, o slide é um mapa mundi,no qual cores indicam os índices de percepção de corrupção levantados pela ONG Transparência Internacional. O slide subseqüente também é um mapa mundi, porém, tratando do acesso digital levantado pela UIT (União Internacional das Telecomunicações). “Reparem que onde o acesso digital é maior, há mais crescimento econômico, há mais oferta, há mais lucro, há mais serviço. Veja como a Coréia está bem situada. E também há menos percepção de corrupção”.

“E o futuro?”. Entra o slide dos meninos de rua. “Que futuro vamos construir para os nossos jovens? Pode ser o futuro da pobreza, do crack, da miséria. Pode também ser o futuro de mais emprego, de mais educação, de mais dignidade na relação do cidadão com o Estado Digital”.

A metralhadora crítica do empresário continua girando através de seu discurso: “o Governo não tem mostrado competência ou capacidade para fazer isso. Embora a lei determine que determinados compromissos de Governo devam acontecer, que os fundos devem ser aplicados para determinados fins, que o Governo precisa ter compromisso com o longo prazo, a lei é absolutamente descumprida”.

Em tom irônico, diz o palestrante quê: “já que a lei não foi cumprida, está tudo bem. Vamos deixar isso para trás!”, para dar o recado: “como cidadão, eu me recuso a aceitar isto. Como vamos construir um futuro em bases fluídas? Se uma lei foi feita no Congresso, determinando que ações do Governo aconteçam e que o próprio Governo não as cumpre, todos acham isto muito natural. A lei precisa ser cumprida. Se a lei não é boa, então, vamos debater e mudá-la”.

O ensino sem filantropia

“Assim como o Brasil é bom de samba (slide correlato), ele precisa ser bom de escola”. Um slide, a seguir,mostrou o Centro Educacional Gisno – uma escola pública de Brasília e a primeira experiência da Escola Digital Integrada –, com um grande 70%. “Este é um empreendimento feito pela Siemens, pela Samurai, pela Brasil Telecom e pela Universidade de Brasília que olharam essa oportunidade, não como filantropia, e sim como lucro. Nessa escola, antes do experimento, a média de aprovação no vestibular era de 3% e o grau de aprovação final no ensino médio, de 30 a 40%. A turma em que a prova de conceitos foi implementada fez 70% de aprovações no vestibular e 100% de aprovação ao final no ensino médio”.

A seguir, Carlos Rocha comentou que a Audit Comission (sede em Londres, com 2.500 funcionários) audita a utilização do dinheiro público e indica as estratégias de Governo, com destaque para a inovação. O Governo quer minimizar a burocracia e maximizar o impacto de seus serviços. O setor de TIC (Tecnologia da Informação e da Comunicação) é o instrumento para viabilizar esse objetivo. O Governo, na sua atual forma de gestão, não tem capacidade para fazer isso. O centro de tudo é o consumidor. Não se trata de um consumidor anônimo e sim de um consumidor identificado, com informação segura num banco de dados.

Admitindo trata-se de assunto polêmico, disse o empresário que a “portabilidade numérica”, juntamente com um banco de identificação, ao invés de ser vista como uma ameaça, deveria ser encarada como uma benção, como um instrumento de lucro, como uma oportunidade para novas receitas. Há que se olhar o cidadão – que gera riqueza das mais diversas formas – e o negócio. É preciso deixar de olhar o cidadão como um coitadinho que precisa receber assistencialismo do Estado. É preciso gerar emprego e renda. O setor de telecomunicações pode ser o instrumento para tal”.

Carlos Rocha continua a desenvolver sua tese: “as operadoras já fizeram várias ações para atrair tráfego. Se o setor de telecomunicações tivesse um banco de dados com o prontuário médico eletrônico dos usuários – nos EUA isto já existe, só que feito pelo Governo – , tal prática iria atrair uma enormidade de tráfego. As empresas iriam acessar esse registro único do cidadão. Uma plataforma de serviços iria trazer novos negócios para o setor. Também poderia ser criado pelo setor um Instituto de Educação, liderado pela TELEBRASIL, e que poderia unificar as ações sociais das empresas do setor. Uma tremenda oportunidade de lucro e não de ação filantrópica”.

Prosseguindo, exibiu num slide a Web 2.0 – que facilita a colaborarão e compartilhamento entre usuários –, disponível com uma série de serviços, sendo necessário “monetizá-los”, lançando mão de recursos como o ICMS. Depois do slide da Web 2.0, surge no telão um com o ICMS arrecadado por Estado. O recado é dado novamente pelo palestrante: “precisamos ajudar o Estado a gastar melhor o dinheiro arrecadado, fazendo mais coisas e trazendo mais responsabilidades para prestação dos serviços para dentro do setor de telecomunicações competindo com outros setores”.

Negócios sem ideologia

Ao final da palestra, Carlos Rocha mostra slides com frases de impacto. A primeira é do consultor indiano de negócios e economista Coimbatore Krishnarao Prahalada (no slide abreviado C. K.), da Universidade de Michigan: “o futuro dos negócios está na base da pirâmide. Concentrar-se em criar produtos e serviços acessíveis às camadas carentes da população é uma fonte estratégica para diminuir a pobreza”. A seguir, sugestão do educador e antropólogo mineiro Darcy Ribeiro, de esquerda: “o importante é inventarmos o Brasil que nós queremos”, que se alinha com o consultor austríaco, de direita, Peter Drucker: “a melhor maneira de predizer o seu futuro é construí-lo”.

Comentou o empresário: “o futuro do setor está nas nossas mãos e não cabe ao Estado definir o nosso futuro. Se não soubermos para onde vamos, aí, não iremos para lugar nenhum”. A observação de Winston Churchill aparece nos telões: “os homens tropeçam na verdade de tempos em tempos, mas se levantam e saem andando rapidamente, como se nada tivesse acontecido”, surgindo a imagem do carismático ex-primeiro ministro inglês, com seu tradicional charuto. Novamente instiga o palestrante: “vocês vão prestar atenção na oportunidade ou vão deixar a verdade passar?”. Ainda iriam aparecer quatro slides. Um deles é “Serviço Digital é o nosso futuro”, com um cartão com chip sobre um teclado de computador. O outro, “Ação integrada”, com o logo das empresas.

O penúltimo slide é uma brincadeira com a mitologia da era da eletrônica, que toda a platéia que assistiu aos filmes da saga Star Wars (de George Lucas, de 1977) reconhece. A imagem de mestre Yoda, instrutor dos jovens Jedi, com a retranca no inglês arrevesado do homúnculo verde: “Then now the time is, commander”. Para terminar, a visão da bandeira brasileira ao vento. Palmas da platéia. Ninguém conseguiu ficar indiferente. A força dos Painéis da TELEBRASIL, ao longo dos anos, repousa no fórum democrático.

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