51° Painel TELEBRASIL: Brasil Digital surge como realidade irreversível – IX

Dois Debates Executivos formaram o backbone do 51o Painel, ocorrido na Costa do Sauípe (BA), de 31/05/2007 a 02/06/2007, que teve como tema o Brasil Digital. Um trouxe a “Visão das Operadoras” e o outro, a “Visão dos Fornecedores”. O debate das operadoras reuniu top executives das prestadoras de serviço Brasil Telecom, Claro, CTBC, Embratel, NET, Oi, Organizações Globo, Telefônica, TVA e Vivo. Neste módulo, Ricardo Knoepfelmacher (presidente da Brasil Telecom), pela operadora de serviço fixo; e João Cox (presidente da Claro), pela de serviço móvel. Brasil Telecom, Claro, CTBC, Embratel, NET, Oi, Telefônica, TVA e Vivo são associadas TELEBRASIL.

Coordenou a apresentação do Debate Executivo com a “Visão das Operadoras” o jornalista Ethevaldo Siqueira da Telequest e colunista de O Estado de São Paulo. Iniciou elogiando o QI (quociente de inteligência) dos participantes. Conciliador, comentou estar de verde (uma referência à cor da camisa) como um sinal de paz. Com isto, despertou risos francos e coniventes de um plenário que havia assistido às suas fortes intervenções do dia anterior (veja Debate II).

Orientando os palestrantes, disse o coordenador que o ponto central da discussão deveria ser como o fenômeno da convergência poderia contribuir para a construção de um Brasil Digital. Cada um dos noves palestrantes da pauta deveriam ressaltar os fatores positivos que poderiam levar ao Brasil Digital, bem como as estratégias preferidas por cada uma das empresas que representava. “O objetivo comum é o de servir ao País, procurando levar os maiores benefícios possíveis que a tecnologia permite a cada cidadão, a fim de melhorar sua qualidade de vida e sua realização humana. Todos estamos do mesmo lado e no mesmo barco”, afirmou o colunista especializado de “O Estado de São Paulo”.

Para Ethevaldo Siqueira, “dentre os desafios a vencer, o maior será o do marco regulatório”. No seu entender, será preciso uma lei unificada que englobe as comunicações como um imenso guarda-chuva. Também será necessário haver uma agência única, capaz de mediar interesses e harmonizar conflitos, a exemplo do que sucede em outras países. Segundo o jornalista, seria infantil dizer que existe conflito entre radiodifusão e telecomunicações. “Equivaleria a afirmar que hardware e software lutam entre si, enquanto que um não saberia viver sem o outro”. Continuando a formular analogias, o jornalista disse que “quem constrói uma grande estrada precisa de ter nas mesmas veículos dotados com conteúdo. Não faz sentido ter uma estrada sem veículos ou ter estes sem a estrada”.

Voltando para os aspectos mais concretos e como o coordenador do seminário, Ethevaldo Siqueira fez um apelo para que os pronunciamentos dos palestrantes presentes à mesa fossem de dez minutos cada, para dar maior tempo ao debate final.


Ricardo Knoepfelmacher (presidente da Brasil Telecom)
Radiodifusores devem ser sócios no Projeto do Brasil Digital.

Ricardo Knoepfelmacher disse que o conceito de Convergência é mundial. Declarou-se feliz com o pronunciamento do conselheiro José Leite, anunciando que a Anatel vai virar uma agência convergente. O Brasil está maduro para adotar esse conceito, ainda que alguns obstáculos precisem ser superados. Hoje, a questão das redes e de tecnologias estão de tal forma misturadas que é difícil entender onde está a fronteira de um serviço ou, pior, ouvir que “este serviço pode e aquele outro não pode”.

Para o presidente da Brasil Telecom, todos os serviços – de Tecnologia da Informação, fixos, móveis, TV por assinatura, provedores de conteúdo – estão misturados num grande pool que forma o Brasil Digital. É preciso entender de que maneira esse grande modelo convergente poderá melhor beneficiar as pessoas. Explicou o executivo que no Brasil, por questões regulatórias, tem-se um modelo híbrido e um modelo puro de triple e de quadruple play, argumentando existir uma assimetria.

Assim, a oferta de serviço de voz pode ser feita utilizando o STFC (Serviço de Telefonia Fixa Comutado) no modelo híbrido e por VoIP (voz sobre protocolo internet) no modelo puro. A TV por assinatura pode ser feita utilizando DTH (direct to home) via satélite através de parceria. O presidente da Brasil Telecom lamentou que a empresa não conseguisse entrar mercado do triple ou quadruple play puros, que seria oferecer “todos os serviços já prontos e unificados para o cliente”. A grande questão envolvida no atual quadro é que “a Brasil Telecom quer estar no mercado de TV por assinatura”, insistiu seu presidente.

Utilizando um slide, mostrou o palestrante que, hoje, devido a uma assimetria regulatória, a banda larga das empresas concessionárias (utilizando ADSL – asyncrhonous digital subscriber line, sobre a rede de pares de cobre) cresceu 33%, enquanto uma empresa (com rede de cabo) conseguiu crescer 84%. Disse Ricardo Knoepfelmacher, não sem certa ironia, que essa “competência impressionante” vem do fato que a citada empresa pode atuar no setor de concessionária, ao passo que a concessionária não pode atuar no setor dessa empresa. “Esta empresa pode oferecer TV por assinatura, banda larga (para uso na Internet) e telefone de graça (VoIP), enquanto nós da Brasil Telecom não podemos oferecer o nosso triple play”.

Percutindo com sua análise do triple play, argumentou Ricardo Knoepfelmacher que há também uma concentração muito grande na oferta da TV a cabo – nas áreas de elevado interesse econômico – em torno de uma só empresa (referiu-se à NET no slide) que controla quase 80% do mercado. O Brasil já está com banda larga em quase 2 mil municípios (1.953) e sua penetração em TV a cabo alcança somente 159 cidades. A TV a cabo se concentra nos municípios de grande interesse econômico, onde as empresas de TV a cabo conseguem ganhar dinheiro e têm interesse na construção de suas redes.

Tomando como exemplo o Paraná, “um estado rico com mais de 20 operações de TV a cabo”, a Brasil Telecom apresenta uma abrangência muito maior. Por que o consumidor, no Brasil, precisa ter sua escolha limitada na TV por assinatura, se ele poderia escolher – como em outros países – o uso de outra tecnologia como IPTV (Internet) DTH (satélite), par trançado (ADSL) ou cabo?. “Por que no Brasil temos imposto de renda via internet e não pode ter TV por assinatura utilizando a maravilhosa infra-estrutura que foi construída nos últimos nove anos?”, questionou o executivo.

Afirmou Ricardo Knoepfelmacher que no Brasil, um país grande e continental, é muito importante entender que para conseguir uma vitória é preciso haver uma aliança – e não um confronto – entre radiodifusores e telecomunicadores. Para o executivo, polarizar posições é um jogo de atrito e de perde-perde. É preciso fazer com que os radiodifusores sejam sócios no Projeto do Brasil Digital e ganhem dinheiro com isto. No mundo inteiro, já há mais de 200 operações de IPTV (televisão por Internet). A France Telecom, por exemplo, tem 230 canais de broadcasting. A Verizon possui 340 canais de broadcasting, dos quais 41 são em HDTV (high definition teve). Isto significa dar qualidade e poder de escolha para o cliente. Em qualquer lugar do mundo, hoje, esse fenômeno já é visto como algo perfeitamente natural. O Brasil está na contramão do processo.

O presidente da Brasil Telecom destacou que, num projeto para um Brasil Digital, será preciso determinar que instrumentos de política pública estejam disponíveis para fomentar como as empresas vão internalizar a Banda Larga. “Sabemos que diminuir o abismo digital é importante e que 172 mil escolas precisam ter acesso em banda larga. No entanto, cada país adotou uma estratégia diferente”.

Países de população concentrada como a Coréia do Sul – 49 milhões de habitantes (487 habitantes/km2) e PIB per capita de US$ 16 mil anuais – tem hoje 89% dos domicílios (14 milhões de acessos) servidos por banda larga. O Canadá, de população dispersa – 33 milhões (quatro habitantes/km2) –, mas com recursos (PIB per capita de U$ 34,1 mil anuais),tem 62% dos domicílios (7,5 milhões de acessos) com banda larga. Países como Brasil (5,5 milhões de acessos), Índia (2,1 milhões de acessos) e Argentina (1,3 milhão de acessos) estão, porém, muito abaixo dos países citados em termos de penetração da banda larga.

No entendimento de Ricardo Knoepfelmacher, para resolver o problema da Banda Larga no Brasil, é preciso utilizar a infra-estrutura que o Brasil tão bem soube criar. Hoje, o País conta com quase 40 milhões de linhas fixas em serviço, mais de 100 milhões de celulares e já passou das 4,5 milhões de linhas ADSL. O Brasil, tangido por interesses comerciais, caminha para a universalização da banda larga, mesmo sem as obrigações explicitas contratadas no Plano de Universalização das concessionárias do Serviço de Telefonia Fixa Comutado.

Enfatizou o palestrante que o problema para implantação da banda larga surge quando não ocorre uma solução dada pelo mercado. Em Rondônia, na área de concessão da Brasil Telecom, por exemplo, dos 51 municípios existentes, há banda larga disponível em 49 deles, porque lá se descobriu mercado. Como resolver, porém, o problema da banda larga para as classes econômicas D e E, onde não aflora o interesse comercial? “Com uma política pública de inclusão digital”, respondeu o palestrante para quem o Brasil Digital passa por um mosaico de vertentes: Governo, fornecedores, provedores de serviços e de conteúdos, financiadores e concessionárias.

Ao Governo cabe definir políticas, tais como trocar obrigações de PST (posto de serviço telefônico) por Banda Larga. “Cerca de 60% dos PSTs da Brasil Telecom não recebem um só cliente há um ano. Por que investir então em PSTs, algo anacrônico, se esse dinheiro poderia ser mais bem utilizado para universalizar a Banda Larga? É um assunto importante e complexo, mas que precisa logo ser feito. Quanto às concessionárias, lhes caberá continuar ampliando a infra-estrutura de Banda Larga, algo que elas, aliás, já estão fazendo”.

Aos fornecedores de cabos, equipamentos e computadores cabem trabalhar ofertando produtos a baixo custo e acessíveis. Mas, será preciso criar conteúdo para tudo isto. A Brasil Telecom tem experimentado no estado de Goiás, com a implantação de banda larga em cerca de 200 escolas, que, no entanto, ainda não gozam desse serviço. Falta capacitar professores e instalar equipamentos (que não é a missão da Brasil Telecom). E, obviamente, serão necessários os financiadores.

Finalizando sua apresentação, Ricardo Knoepfelmacher fez um resumo dos principais pontos: as empresas de telecom têm, de fato, uma infra-estrutura pronta e formidável para prover serviços à sociedade e que precisa utilizar para banda larga; a Brasil Telecom quer entrar no mercado de TV por assinatura; na construção de um Brasil Digital, é preciso agregar um conjunto de esforços, numa visão sistêmica de longo prazo – a Brasil Telecom quer fazer parte de tal solução.


João Cox (presidente da Claro)
A universalização é possível com o celular.

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A propósito de fazer um pronunciamento em tempo muito curto, João Cox insinuou que seria tempo de ressuscitar um falecido deputado que, em apenas cinco segundos (“meu nome é fulano”), dava seu recado político. Declarou o presidente da Claro que a perspectiva adotada para sua palestra seria, como não poderia deixar de ser, de uma operadora celular e que abandonaria uma palestra que tinha pronta com slides, para falar mais livremente.

Começou por lembrar que, há cerca de dez anos, os que estavam presentes num Painel TELEBRASIL, provavelmente estariam carregando um aparelho celular. Hoje são 104 milhões de acessos móveis no País e sua utilização tornou-se um hábito arraigado à cultura brasileira. “Quantas pessoas, ao sair de casa de manhã, não voltaram para pegar um celular que haviam esquecido, por não poder encarar um dia inteiro de trabalho sem o auxílio do precioso aparelho?”, lembrou o executivo que mostrou ser difícil o caminho da evolução para novos serviços.

– Logo depois da privatização, com o celular ainda sendo utilizado apenas para voz, foi pensado em utilizá-lo também para o envio de mensagens curtas, o famoso SMS (short message service) – comentou João Cox, recordando as discussões ocorridas na época com os reguladores, em torno da questão sobre o que aconteceria com a indústria de pagers (serviço de recados), com a introdução do novo serviço SMS no celular. Discutiu-se na época que poderia haver SMS no celular sim, porém gratuito. O SMS iria poder competir,mas tal solução seria mortal para a indústria de pagers.

Segundo João Cox, a chegada do SMS no celular foi um dos primeiros sinais de convergência. Depois, se especulou se a Internet poderia ser acessada pelo celular, mas se interrogou se a banda seria suficiente? E, aos poucos, se viu que era possível enviar mensagem pela Internet com fotografia e com acesso a e-mails sincronizados e com interatividade com os e-mails no desktop do escritório. “É muito difícil, por mais que sejamos competentes, que possamos imaginar quando irá parar tal progresso. O fato permanece que a convergência vai além do que recentemente vem sendo discutido, a respeito”.

Dando elementos para a sua tese sobre convergência, o palestrante argumentou que, “sim, há possibilidade de haver televisão no celular”; que, “sim, já há rádio no celular”; que, “sim, há possibilidade de se fazer transações pelo celular”. Em realidade, num restaurante, ao entregar um cartão para pagmento, o garçom vai passá-lo num POS (point of sale), que é um celular. E os serviços baseados em localização? “O futuro da indústria é enorme”, prognosticou o executivo, para quem 104 milhões de celulares não devem ser percebidos como “a maturidade da indústria e sim apenas como sua infância”.

Constatou o executivo que o fato de haver, aqui, uma forte base instalada de celulares (104 milhões) dá a escala necessária para a criação de muitos novos serviços. A questão é como ser possível que a convergência se dê. “A experiência mostra que nenhuma operadora, no Brasil e no mundo, quer desenvolver conteúdo e sim transportá-lo”, enfatizou João Cox.

A evolução das telecomunicações tem sido benéfica para a população brasileira. Hoje, 80% da base de celular no Brasil são na modalidade pré-paga; 12,5 milhões de lares brasileiros apenas têm celular pré-pago e não têm telefone fixo; assim como há milhões de lares que só têm telefone fixo e não têm celular. Cada um escolheu a solução que lhe pareceu mais interessante. A questão é como permitir que todo o cidadão brasileiro tenha acesso à convergência.

À luz da tecnologia disponível, o palestrante deu sua percepção de como poderia ocorrer a universalização do serviço. A Anatel e o Ministério das Comunicações precisariam sentar numa agenda pública e aberta e avaliar como seria menos custoso – para a sociedade em geral – estender para a população serviços para quem ainda não os possui. Outro ponto seria rever a estrutura de impostos e taxas que pode às vezes ser perversa e contribuir para concentrar a renda.

Assim, por exemplo, alguns municípios com população até 500 habitantes não possuem telefonia. Assumindo uma taxa de penetração de 30% (uma das mais baixas do País, como na Amazônia), chega-se ao final de alguns anos a 150 usuários. Fazendo um simples exercício numérico, poderia se supor um consumo de pré-pago, de baixo uso, de R$ 10/mês. Isto vai gerar uma receita mensal de R$ 1.500 (R$ 18 mil por ano), mas que terá que desembolsar R$ 6 mil só de ICMS. Vão sobrar R$ 12 mil para pagar outros impostos e fundos, energia elétrica e outros custos. Fica inviabilizado o investimento. O Brasil tem uma das mais altas tributações do mundo em telecomunicações!

O executivo da Claro finalizou sua palestra em tom otimista, achando ser “possível ter a convergência, cobrindo a maior parte da população, desde que todos atuem nesse sentido”. E citou o exemplo de Minas Gerais, que terá, em breve, todo o estado coberto pela telefonia celular.

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